Pontos de leitura. Nem imbecil feliz, nem infeliz imbecil: compreender a época em que vivemos – Luc Ferry

Do mesmo modo que a consciência infeliz, tão bem descrita por Hegel, tendemos a ver na história apenas o que desmorona e morre, quase nunca o que surge e ganha vida. Daí  nossa tendência ao pessimismo, tendência tão forte que dá asas ao pensamento negativo. Ao contrário do otimismo, sempre um pouco tolo, uma visão crepuscular do tempo presente confere de imediato a quem segue uma forte presunção de lucidez, para não dizer de inteligência.

Atualmente, são incontáveis os estudos que anunciam o fim das grandes obras, denunciam as ilusões de sentido, a crise dos valores, do capitalismo, da ecologia, da perda de referências nas novas gerações, o desencantamento do mundo, a era do vazio, o declínio da Europa, do civismo e da moral pública, a derrota do pensamento, a queda da humanidade no negocismo americanizado, o fortalecimento do consumismo festivo e estúpido… Profetiza-se, em páginas e páginas temperadas de Schopenhauer, do apocalíptico Muray ou do indispensável Cioran, o fatal desamparo do velho continente. Crítica desvairada ao bougisme e à agitação contemporânea, ao divertimento tragicômico que invade a sociedade moderna; exaltação da volta ao passado, da lentidão para resistir ao culto da velocidade que toma conta do homem apressado dos tempos modernos; idealização dos modos de vida tradicionais, do campesinato, em contraposição aos erros da industrialização acelerada por meio da globalização liberal, e daí por diante. Pessimismo de todos os níveis.

Ao que eu responderia com o que disse Bernanos: se o otimista é um imbecil feliz, o pessimista, geralmente, é apenas um imbecil infeliz. Observação mais sutil do que parece e que pode servir de contraponto à tendência dos tempos, antimoderna e depressiva, para nos levar a abrir as janelas e tentar em princípio não elogiar nem condenar, mas simplesmente compreender a época em que vivemos.

Luc Ferry, A revolução do amor (Rio de Janeiro: Objetiva, 2012), p. 14-15.

Fonte da imagem: Caspar David Friedrich, Mondaufgang am Meer (1822), óleo sobre a tela.


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por Anders Noren

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