Curso Livre – A Revolução do Dom: vias teóricas de um paradigma

                                                                                                         

Apresentação

O antropólogo francês Marcel Mauss publicou, em 1925, o hoje célebre Ensaio sobre o Dom, que é considerado por muitos, como Claude Lévi-Strauss, um marco d’águas das ciências humanas e sociais. Não faltaram, desde então, iniciativas teóricas e práticas que desenvolveram as intuições nele presentes.

Diante da crise de nosso tempo, o Ateliê de Humanidades se propõe a pensar uma “revolução do dom”; revolução a ser entendida em duplo aspecto: na teoria, quando propõe outras formas de explicação e compreensão da vida social; e na prática, quando pensa o dom como horizonte da ação em diferentes esferas. O presente curso tem o intuito de apresentar os possíveis fundamentos teóricos do dom. Ele se divide em três módulos. Primeiramente (I), fazemos uma apresentação do próprio Ensaio sobre o Dom, contextualizando-o historicamente e no interior da obra do autor. Em seguida (II), apresentamos as distintas interpretações do dom feitas por alguns dos principais intelectuais franceses do século XX: a do estruturalismo de Claude Lévi-Strauss, a do surrealismo de Georges Bataille, a da fenomenologia de Claude Lefort, a da sociologia crítica de Pierre Bourdieu, e a da filosofia da hospitalidade de Jacques Derrida. Por fim, no último módulo (III), fazemos um percurso pelas tentativas contemporâneas de construção de uma teoria e prática do dom, feitas por intelectuais como Alain Caillé (líder do Movimento Anti-Utilitarista em Ciências Sociais – M.A.U.S.S.), Jacques Godbout, Marcel Hénaff, Paul Ricoeur etc.

Na conclusão, refletimos sobre a fecundidade da problemática do dom para investigações em sociologia, antropologia, psicologia, história, religião, ética, economia, política e estudos organizacionais.

Programa do Curso

 Módulo. O Ensaio sobre o Dom: tradição, contexto e leitura

  1. O Ensaio sobre a Dádiva: seu lugar no interior da obra de Marcel Mauss
  2. Potlatch, kula e hau: os termos da problemática na tradição antropológica
  3. A geografia e a história da dádiva: debruçando-se sobre o material etnográfico
  4. Exposição sistemática do Ensaio

IIºMódulo. Distintas Vias de Interpretação do Dom

  1. A Interpretação de Claude Lévi-Strauss. O Ensaio como Novo Organum do Estruturalismo
  2. O Dom, o reconhecimento e a constituição do laço político. Claude Lefort
  3. Potlatch como anti-utilitarismo radical: antropologia da consumação de Georges Bataille
  4. O interesse denegado e o dom desinteressado. Pierre Bourdieu
  5. O Dom Impossível de Jacques Derrida

IIIº Módulo. Por uma Revolução do Dom? Propostas Contemporâneas

  1. Dom como paradigma integral: Jacques Godbout & Alain Caillé
  2. O Mouvement Anti-Utilitariste en Sciences Sociales (M.A.U.S.S.)
  3. Alain Caillé e a teoria antiutilitarista da ação
  4. Paul Ricoeur, dom e reconhecimento: entre Mauss e Lévinas
  5. Outras elaborações teóricas sobre o dom

Conclusão. Repercussões potenciais de uma tentativa de revolução paradigmática

Objetivos

  • realizar uma exposição histórica, didática e sistemática do Ensaio sobre o Dom, de Marcel Mauss;
  • apresentar as distintas vias teóricas resultantes das interpretações do Ensaio, feitas por alguns dos principais pensadores franceses do século XX;
  • percorrer as tentativas contemporâneas de construção de uma teoria do dom, apresentando também sua fecundidade sobre investigações disciplinares, inter- e transdisciplinares.

Público alvo

  • Estudantes, pesquisadores, professores ou demais interessados em ciências sociais, filosofia, teoria social, teoria antropológica e antropologia geral, bem como em áreas especializadas – especialmente etnologia, antropologia política, filosofia moral, filosofia política, antropologia econômica e teoria da religião.
  • Pesquisadores ou demais interessados em leituras realizadas na interface entre antropologia clássica, teoria social e filosofia contemporânea, ou que estejam interessados na presença, elaboração e apropriação de questões teóricas e filosóficas nas áreas de ciências humanas e sociais, com repercussões sobre os mais distintos saberes disciplinares.

Professor: André Magnelli

Apoio tutorial: Rafael Damasceno

Período: de 02/08 a 06/09 – todas as quintas feiras

(Dias 02, 09, 16, 23, 30 de agosto e 06 de setembro)

Horário: de 18:00  a 20:30

Local: Mediathèque da Maison de France – Av. Presidente Antônio Carlos 58/11º, Centro

Carga horária: 15 horas/aula – 6 encontros de 2 h e 30 min

Certificado: Confere certificado mediante 75% de presença nas aulas.

Investimento: 350,00 reais (pagamentos no boleto, débito, crédito ou depósito em conta)


Bibliografia Básica

1. MAUSS, Marcel (1925). Ensaio sobre a dádiva. In: MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia. São Paulo: Ubu, 2017.

2. LÉVI-STRAUSS, Claude. Estruturas elementares do parentesco (cap.V, cap.XXIX). Petrópolis: Vozes, 1982 [1a edição 1949, 2a edição 1967].

LÉVI-STRAUSS, Claude (1950). Introdução à obra de Marcel Mauss. In: MAUSS, Marcel. Antropologia e sociologia. São Paulo: Ubu, 2017 

3. LEFORT, Claude (1951). A troca e a luta entre os homens. In: LEFORT, Claude. As Formas da História. São Paulo: Brasiliense, 1979.

4. BATAILLE, Georges. (1933) A noção de dispêndio. In: A Parte Maldita. Precedido de A Noção de Dispêndio. Autêntica, coleção Filo, 2013 [1957]. p.17-33.

5. BOURDIEU, Pierre (1996). Marginalia. Algumas Notas adicionais sobre o dom. MANA 2(2):7-20.

6. CAILLÉ, Alain [1996] Nem Holismo nem individualismo metodológicos. Marcel Mauss e o paradigma da dádiva. Rev. bras. Ci. Soc. vol. 13 n. 38 São Paulo Oct, 1998.

_______. (2005) O dom entre interesse e “desinteressamento”. Realis: Revista de Estudos AntiUtilitaristas e PosColoniais, vol.3, n.1, jan-jun 2013. p.7-42.

_______ (2008). Dom e Reconhecimento. RBCS Vol. 23 nº. 66 fevereiro.

7. RICOEUR, Paul. Percurso do Reconhecimento. São Paulo: Loyola, 2006 [2004] (cap.5).


Bibliografia para aprofundamento de estudo

ATHANÉ, François. Pour une histoire naturelle du don. Paris: PUF, 2012.

BATAILLE, Georges. O Erotismo. Autêntica, coleção Filo, 2014 [1957].

_______. A Parte Maldita. Autêntica, coleção Filo, 2013 [1949].

BENVENISTE, Émile. Vocabulario de las Instituciones Indoeuropeas. Madrid: Taurus, , 1983 [1969] (Volume 1: Economía, Parentesco y Sociedad, Primera Parte, Libro 1: La Economía, Sección II. Dar y tomar, p.43-78.

BOLTANSKI, Luc. L’ amour et la justice comme compétences. Paris: Gallimard, 1990.

BOURDIEU, Pierre. O senso prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

CAILLÉ, Alain. Critique de la Raison Utilitaire. Manifeste du Mauss. Paris: Editions la Découverte/MAUSS, 1989.

_______; GODBOUT, Jacques T. O Espírito da Dádiva. Lisboa: Piaget, 1992.

_______. A demissão dos intelectuais. Lisboa: Instituto Piaget, 1993.

_______. (1993) Introdução. As Ciências Sociais e o Esquecimento do Fator Político. In: A demissão doïs intelectuais. Lisboa: Instituto Piaget, 1993.

_______. (1992/1993) Em Prol de uma Ciência Social que seja uma Filosofia Política e reciprocamente. In: A demissão dos intelectuais. Lisboa: Instituto Piaget, 1993.

_______. (1998) Dom e Simbolismo. In Antropologia do dom: o terceiro paradigma. Petrópolis: Vozes, 2002. 

CAILLÉ, Alain. Antropologia do dom: o terceiro paradigma. Petrópolis: Vozes, 2002.

_______. Théorie anti-utilitariste de l’action: Fragments d’une Sociologie Générale. Paris: Editions la Découverte/MAUSS, 2009.

_______. Anti-Utilitarisme et Paradigme du Don. Pour Quoi?. Paris: Le Bord de l’Eau, 2014.

DERRIDA, Jacques. Donner le Temps. 1. La Fausse Monnaie. Éditions Galilée, 1991.

_______. Donner la mort. Paris, Galilée, 1999.

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DZIMIRA, Sylvain. Marcel Mauss, savant et politique. Paris: La Découverte, 2007.

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_______.  Le paradigme du don : paradigme antiparadigmatique des paradigmes socio-économiques ? Contribution anti-utilitariste pour une association des forces théoriques anticapitalistes et réformistes. Revue du MAUSS 1/2003 (no 21) , p. 355-382.

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POLANYI, Karl, La Grand Transformation: Aux Origines Politiques et Économiques de Notre Temps (Prefácio de Louis Dumont). Paris: Gallimard, 1983 [1944].

REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS. Dossiê sobre Dádiva. vol. 23 n.66 São Paulo Feb. 2008.

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por Anders Noren

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