Curso Livre. A Máquina Selvagem: A antropologia política de Pierre Clastres

“…é preciso aceitar a ideia de que a negação não significa um nada, e de que, quando o espelho não nos devolve nossa imagem, isso não prova que não há nada a se observar.” (Pierre Clastres)

Professores

André Magnelli & Rafael Damasceno

Apresentação do curso

Pierre Clastres (1934-1977) é sem dúvidas um dos grandes nomes da tradição antropológica. Tal como seu antigo mestre, Claude Lévi-Strauss, sua obra fecunda os mais diversos campos de reflexão filosófica e de investigação em ciências humanas. De Gilles Deleuze e Félix Guattari a, dentre outros, Eduardo Viveiros de Castro, Tânia Stolze Lima e Renato Sztutman, a filosofia contemporânea e a etnologia ameríndia portam em si as suas marcas. Caminhar por entre os rizomas deleuzianos ou pensar as metamorfoses do perspectivismo ameríndio demandam uma incontornável passagem pelo seu pensamento, que, apesar da precoce morte em 1977, permanece ainda vivo em sua intempestividade.

Defronte a interpelação de R. Sztutman, que se nos indaga se a obra de Clastres é ainda hoje “boa para pensar”, nosso curso tem o intuito de expô-la criativamente. Inicialmente, reconstruiremos as teses clastrianas, presentes, em especial, nos escritos compilados em Sociedade contra o Estado (1974) e Arqueologia da Violência (1980); faremos isso tanto em uma perspectiva transversal – apresentando os conceitos e temas que estruturam seu pensamento -, quanto também longitudinal – ao tratar do desenvolvimento de suas ideias e investigações, teóricas e etnográficas, ao longo da vida. No final, faremos breves considerações sobre as repercussões das ideias clastrianas na filosofia francesa contemporânea – a saber, na filosofia e história do político de Marcel Gauchet e na esquizoanálise de Deleuze e Guattari -; e também refletiremos sobre suas contribuições para pensar questões de nosso tempo, em especial a democracia, o novo regime climático, a causa indígena e os efeitos da produção tecnológica.

Objetivos 

  • Reconstruir a obra de Pierre Clastres tanto em uma perspectiva transversal – apresentando os conceitos e temas que estruturam seu pensamento -, quanto também longitudinal – ao tratar do desenvolvimento de suas ideias e investigações, teóricas e etnográficas, ao longo da vida; ao fazer isso, buscaremos interfaces de sua obra com as tradições filosófica (Hobbes, Maquiavel, Heidegger e Nietzsche) e antropológica (Bateson, Lévi-Strauss, dentre outros);
  • Apresentar as repercussões, os desdobramentos e a possível atualidade do pensamento clastriano na filosofia e na antropologia contemporâneas.

Público alvo

  • Estudantes, pesquisadores, professores ou demais interessados em ciências sociais, filosofia, teoria antropológica e antropologia geral, bem como em áreas especializadas – especialmente etnologia, antropologia política, filosofia política, mitologia e antropologia econômica.
  • Pesquisadores ou demais interessados em leituras realizadas na interface entre etnologia neoclássica e filosofia contemporânea, ou que estejam interessados na presença, elaboração e apropriação de questões filosóficas nas áreas de ciências humanas e sociais.

 

Período : 12/11, 19/11, 26/11

Horário: 18:30h-20:30h

Carga horária : 6 horas/aula – 3 sessões de 2 h

Investimento: R$ 180,00

Certificado: Confere certificado mediante 75% de presença nas aulas.



Programa

1. A obra e o autor: contexto histórico, interlocuções e repercussões

1.1. Pierre Clastres (1934-1977), o copérnico do político

1.2. Clastres, a filosofia, a etnologia e a história

1.2.1. Sentidos do Contra-o-Estado: um diálogo com a história da América do Sul
1.2.2. Clastres, um leitor de Nietzsche e Heidegger
1.2.3. Uma outra filosofia: Maquiavel, Locke, Hobbes e o problema da servidão voluntária
1.2.4. Teoria, Estado e a História na tradição antropológica: a revolução copernicana
1.2.5. Entre fenomenologia, estruturalismo e esquizoanálise: o contexto de um pensamento
1.2.6. Panorama das repercussões na filosofia e na antropologia contemporâneas

2. Pensar a sociedade contra-o-Estado.

2.1. O dispositivo do contra-o-Estado

2.1.1. Parentesco, demografia, troca e poder
2.1.2. Teoria da economia e da tecnologia primitiva 

2.2. Figuras do contra-Estado

2.2.1.  A chefia indígena: palavra, discurso e poder
2.2.2. Mitologia, xamanismo e profetismo: a “terra sem mal” tupi na etnografia de Helène Clastres
2.2.3. A guerra selvagem: o maquinismo social e o infortúnio do guerreiro

3. Nos Rastros de Clastres: entre o Político e a Esquizoanálise.

4. Pensar o presente: cosmopolíticas, democracias e etnocídios


Bibliografia Básica

CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado. São Paulo: Ubu, 2003

________. Arqueologia da Violência: pesquisas de antropologia política. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.

________. Entre o silêncio e o diálogo. In. Lévi-Strauss. L’arc. São Paulo: Documentos, 1968.

Bibliografia para aprofundamento de estudo

ABENSOUR, Miguel. (ed.). L’Esprit des Lois Sauvages: Pierre Clastres ou une Nouvelle Anthropologie Politique. Paris: Seuil, 1987.

CARNEIRO DA CUNHA, Manuela (org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

CLASTRES, Pierre. Crônica dos índios Guayaki: o que sabem os Aché, caçadores nômades do Paraguai. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995 [1972]

_______. A fala sagrada: mitos e cantos sagrados dos índios Guarani. Campinas, SP: Papirus, 1990 [1974]

CLASTRES, Helène. La terre sans mal. Le prophétisme Tupi-Guarani. Paris: Seuil, 1975.

Coleção Franceses no Brasil. Séculos XVI e XVII. 4 volumes. Fundação Darcy Ribeiro. Editora Batel, 2009.

DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2; Vol 3, Platô 8. São Paulo: Editora 34, 1995 [1980]. p. 69-89.

_______. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2; Vol 3, Platô 9. São Paulo: Editora 34, 1995 [1980]. p. 91-125.

_______. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2; Vol. 5, Platô 12. São Paulo: Editora 34, 1995 [1980]. P.11-118.

_______. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2; Vol. 5, Platô 13. São Paulo: Editora 34, 1995 [1980]. p.119-190.

DESCOLA, Philippe. La chefferie amérindienne dans l’anthropologie politique. Revue Française de Science Politique, 38 (5), p.818-827, 1988.

GAUCHET, Marcel. A dívida do sentido e as raízes do Estado: política da religião primitiva. In: CLASTRES, P.; GAUCHET, M. et al. Guerra, Religião, Poder. Lisboa: Edições 70, 1980.

FAUSTO, Carlos. Os Índios antes do Brasil. Coleção Descobrindo o Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2000.

LAPOUJADE, David. Deleuze, os movimentos aberrantes. São Paulo: n-1 Edições, 2015.

LEFORT, Claude. Dialogue avec Pierre Clastres (1987). In.: LEFORT, Claude. Ecrire à l’Épreuve du Politique. Paris: Calmann-Lévy, 1994.

LÉVI-STRAUSS, Claude. Estruturas elementares do parentesco. Petrópolis: Editora Vozes, 1967[1947].

LIMA, Tânia S.; GOLDMAN, M. “Prefácio”. In.: CLASTRES, P. A sociedade contra o Estado. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. p. 7-20.

SAHLINS, Marshall. A sociedade afluente original. In.: SAHLINS, M. Cultura na prática. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2004.

_______. Âge de pierre, âge d’abondance: l’économie des sociétés primitives. Paris: Gallimard, 1976[1972]. 

SHEILA, Hue. Primeiras cartas do Brazil, 1551-1555. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. 

LORAUX, Nicole. Notes sur l’un, le deux et le multiple. In: ABENSOUR, M. (ed.). L’Esprit des Lois Sauvages: Pierre Clastres ou une Nouvelle Anthropologie Politique, p. 155-171. Paris: Seuil, 1987.

PRADO Jr., BENTO. Prefácio, in Arqueologia da violência: estudos de antropologia política. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.

SZTUTMAN, Renato. Os Tupi Antigos Reencontrados. SZTUTMAN, Renato. O profeta e o principal: A ação política ameríndia e seus personagens. São Paulo: Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP, 2005, p.107-184.

VIVEIROS DE CASTRO, E. Intempestivo (ainda). 2011. Posfácio In. CLASTRES, P. Arqueologia da Violência: pesquisas de antropologia política. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. p.301-360. 

 

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por Anders Noren

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