Condições para uma política legítima

A única política legítima e também a única ética aceitável são aquelas que se inspiram nos cinco princípios seguintes: os princípios de comum naturalidade, de comum humanidade, de comum socialidade, de legítima individuação, de oposição criadora. Esses cinco princípios estão subordinados ao imperativo absoluto do controle da húbris.

Princípio de comum naturalidade

Os humanos não vivem em relação de exterioridade com a Natureza, da qual deveriam se tornar “senhores e possuidores”. Como todos os seres vivos, os humanos fazem parte dela e estão em relação de interdependência com ela. Têm a responsabilidade de cuidá-la. Quando não a respeitam, colocam em perigo sua própria sobrevivência ética e física.

Princípio de comum humanidade

Para além das diferenças de cor de pele, de nacionalidade, de idioma, de cultura, de religião ou de riqueza, de sexo ou de orientação sexual, existe apenas uma humanidade, que deve ser respeitada na pessoa de cada um de seus membros.

Princípio de comum socialidade

Os seres humanos são seres sociais para quem a maior riqueza existente é a riqueza das relações concretas que estabelecem uns com os outros, no âmbito de associações, sociedades ou de comunidades de tamanho e natureza variáveis.

Princípio de legítima individuação

Em conformidade com esses três primeiros princípios, a política legítima é a que permite a cada um desenvolver da melhor maneira sua individualidade singular, desenvolvendo suas capacidades, sua potência de ser e agir, sem prejudicar os outros, na perspectiva da igual liberdade. Diferentemente do individualismo que resulta no cada um por si e na luta de todos contra todos, o princípio da individuação não reconhece valor a não ser nos indivíduos que afirmam sua singularidade com respeito à sua interdependência com os outros e com a natureza.

Princípio de oposição criadora

Porque todos têm vocação para manifestar sua individualidade singular, é natural que os humanos se oponham uns aos outros. Mas só é legítimo que o façam enquanto isso não coloca em perigo o quadro de comum humanidade, de comum socialidade e de comum naturalidade que torna a rivalidade fecunda e não destrutiva. A boa política é, portanto, aquela que permite aos seres humanos se diferenciarem, fazendo com que a rivalidade sirva ao bem comum. O mesmo vale para a ética.

Acrescentamos a esses cinco princípios, que se entrecruzam, um imperativo:

Imperativo do controle da húbris

A principal condição para que a rivalidade e a emulação sirvam ao bem comum é fazer de maneira com que elas escapem ao desejo de onipotência, à desmedida, à desmesura, à húbris (e, a fortiori, à pleonexia, o desejo de possuir sempre mais). Elas se tornam então rivalidades para melhor cooperar.

Dito de outro modo: tentar ser o melhor é fortemente recomendável quando se trata de se distinguir, na medida de seus próprios recursos, para satisfazer as necessidades dos outros, lhes dar o máximo e o melhor possível. Isso é bem diferente do desejo de prevalecer a qualquer custo, tomando dos outros aquilo que lhes cabe.

Esse princípio de domínio da húbris é, na verdade, um meta-princípio, o princípio dos princípios. Ele impregna todos os outros e deve lhes servir de regulador e de salvaguarda. Pois cada princípio levado ao seu extremo e não moderado por outros corre o risco de se converter em seu contrário: o amor pela Natureza ou pela humanidade abstrata se converte em ódio pelos homens concretos; a comum socialidade em corporativismo, clientelismo, nacionalismo ou racismo; a individuação em individualismo indiferente aos outros; a oposição criadora em combate de egos, em narcisismo da pequena diferença, em conflitos destrutivos. Esse imperativo pode então ser chamado de “categórico”.